segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Criadores de abelhas sem ferrão instituem Associação de Meliponicultores


03/10/2016às 11:38
Fotos: AME-ES

Eis que a criança, traumatizada por uma picada de abelha quase fatal, se torna um criador de abelhas sem ferrão e presidente da Associação de Meliponicultores do Espírito Santo (AME-ES).

João Luiz Santos (foto à esquerda) conheceu os simpáticos insetos em 2008, por influência de um amigo a quem pediu sugestões sobre o que produzir dentro de sua propriedade rural na região do Caparaó. Adquirida há mais de vinte anos, a terra ficou longo período se recuperando da pastagem degradada que a ocupava. O retorno à produtividade veio abençoada pelas abelhas nativas da Mata Atlântica.

João conta que foi paixão à primeira vista, logo nas primeiras pesquisas que fez. “São bichos fantásticos. Os únicos que fabricam naturalmente o seu alimento. Uma organização social incrível e de importância imensa para todo o equilibro ambiental. Sem elas não há vida”, discorre, agradecido.  

Daí, foi conhecendo outros criadores, a turma foi se unindo, confraternizando, trocando ... até que decidiu se formalizar em uma associação, criada em 20 de agosto passado, em assembleia realizada em Vitória.

O objetivo é conservacionista, fazer multiplicar a população de abelhas sem ferrão no Espírito Santo. A produção de mel acontece também, mas é secundária, ajuda a subsidiar o trabalho de criação dos ninhos e colônias. “Prioridade não é produção, senão seria cooperativa. É mais preservação, mesmo. É uma terapia, um lazer”, explica João.

O potencial de mercado, no entanto, reconhece o presidente, é enorme. “Quem começou não está dando conta de abastecer o mercado”, relata. As jataís são as mais conhecidas produtoras de mel sem ferrão. O valor do litro fica em torno de R$150,00. As meliponiastambém produzem e o litro está em torno de R$ 100,00

Há também uma demanda crescente por ninhos, muita gente interessada em comprar as colônias pra ter em suas casas e sítios e até em apartamentos. “Demanda urbana grande”, avalia.


Rainhas da polinização na Mata Atlântica

Além do aspecto terapêutico de conviver com abelhas e da possibilidade de saborear pequenas quantidades de um mel suave e saboroso, com muitas propriedades medicinais, a criação de abelhas sem ferrão também tem um apelo ambiental muito importante.

Quem as cria em quintais e sítios, percebe claramente o aumento de produtividade no pomar. “É incrivelmente maior a produção das frutas”, atesta João. No seu caso, laranjeiras e abacateiros têm retribuído abundantemente a presença das abelhinhas.

Mas é na floresta que as bênçãos das meliponias, jataís e uruçús ganha uma dimensão estratégica de conservação da biodiversidade. Por serem nativas, seu poder de polinização é imensamente maior que o das abelhas exóticas, com ferrão, usados pelos apicultores na vasta produção de mel no Espírito Santo. Há quem diga até que a polinização feita pelas exóticas é muito pequena, praticamente insignificante, e que elas espantam as nativas, daí a importância de proteger e investir na multiplicação das espécies locais.

Dentre os vários gêneros e espécies criados por João e outros meliponicultores da AME-ES, a Meliponia capixaba (uruçú capixaba ou uruçú negra) é um xodó quase unânime, por ser uma espécie endêmica do Estado (só existe aqui e em nenhum outro lugar do mundo) e ameaçada de extinção.



Sua distribuição geográfica hoje é muito restrita. Só ocorre em altitudes acima de 700 metros, tendo sido vista em Vargem Alta, Venda Nova do Imigrante, Afonso Claudio, Conceição do Castelo e Domingos Martins. É muito provável que ela ocorra também no Caparaó, observações da Universidade Federal de Viçosa (UFV), que acompanha o trabalho dos associados da AME-ES.

Cursos e palestras gratuitos

Uma ideia, inclusive, surgida dessa parceria, é a de colocação de caixas de meliponiasdentro de parques naturais, porque assim os meleiros terão menos possibilidades de predar as colônias (o meleiro, que entra na mata atrás de mel, geralmente quebra a árvore e o ninho pra fazer a coleta). “Tendência é enxamear na natureza”, brinca João Luiz.

Para reproduzir um ninho, João explica que geralmente usa duas colônias para fazer uma. Ou, às vezes, de apenas uma faz a outra. Por isso a coleta de mel é muito pequena, em média 20%, pois é preciso deixar bastante alimento para que elas fiquem fortes e suportem a divisão da colônia na reprodução do ninho.

Esse trabalho é o coração que une os associados da AME-ES. “O objetivo é que a atividade cresça sempre pautada na proteção da natureza”, fundamenta o presidente. Com apenas um mês e meio de vida formal, a Associação já realizou palestras e planeja a realização de um minicurso de formação básica, gratuito e aberto a todos os associados, no dia 15 de outubro, e, em novembro, mais uma palestra.